Chamou-se simplesmente Morária ou Moreira, o que poderia significar morada, ou local de habitação. Mas não vale a pena ter a pretensão de ir por aí, já que não é possível colher elementos para sustentar tal tese. Que a sua antiguidade se perde na memória dos tempos, é um facto indesmentível, não só pelos pedaços da história que até nós chegaram, como também por todas estas pedras que falam e que atestam a sua ancestralidade. Nos princípios do século X, terá o castelo de Moreira pertencido a dois esposos dos povos godos, que então habitavam a península ibérica, Rodrigo e Leodegunda, tendo deixado uma filha de nome Flâmula ou Chama Rodrigues.

Esta senhora, através de um testamento feito em 960, deixou tudo o que possuía ao mosteiro de Guimarães. Quando da invasão do muçulmano Almansor, Moreira ter-se-á despovoado bem como toda a região em que se integrava e denominava por Estremadura.

Fernando Magno, rei de Leão, quando iniciou a sua campanha lusitana, conquistou Moreira aos mouros em 1055, entrando então no domínio de uns célebres Bragançãos. A partir do século XII Moreira ficará integrada na Coroa, uma vez que os bens pertencentes a Braganção Fernão Mendes, que era cunhado de D. Afonso Henriques, ficaram a pertencer à sua mulher e desta transitaram para a Coroa. D. Afonso III, o Bolonhês, concedeu-lhe carta de foram em 1255, sendo Moreira já município que se estendia até ao Terrenho. Poderá ter sido a partir desta altura, que a nossa terra se terá passado a denominar Moreira de Rei. Que o seu nome está ligado à passagem por cá de um rei, todos nós mais ou menos sabemos ou ouvimos falar. Importa porém referir um facto determinante e que, naquele tempo, poderá ter feito de Moreira um reduto incómodo para o monarca reinante, D. Afonso III.

O rei que Moreira acolheu dentro dos seus muros, foi D. Sancho II, cognominado de Capelo, por em criança ter sido acometido de grave doença e ter usado o hábito de Santo Agostinho. D. Sancho II nasceu em Coimbra em 1209 e era filho de D. Afonso II e da rainha D. Urraca. Herdou o trono com apenas 13 anos de idade e, uma vez que grassava alguma desordem no Reino de Portugal, seu pai fez testamento onde consignava o governo a um grupo de senhores, enquanto se verificasse a menoridade do seu filho herdeiro D. Sancho. Conseguiu-se algum apaziguamento nas relações entre o poder real e a Igreja, mas não conseguiu resolver uma contenda familiar com as suas irmãs. Mesmo assim iniciou uma fase de repovoamento do país, que o seu sucessor haveria de continuar. Revelou-se D. Sancho um digno guerreiro, honrando os intentos de conquista seu avô D. Afonso Henriques, mas fracassou como político, permitindo abusos, corrupção e lutas entre ricos e eclesiásticos.

Em face disto, o clero e alguma nobreza e com a intrigas de seu irmão D. Afonso, apoiados pelo papa Inocêncio IV, promoveram a sua deposição em 1245, mantendo no entanto o título e as honras de rei. O trono foi confiado a seu irmão D. Afonso III, mas D. Sancho não aceitos de bom grado esta deposição e travou luta feroz contra o seu irmão, no que foi acompanhado pelos seus fiéis súbditos. Procurou ainda obter em Castela auxílio militar para lutar contra o irmão, mas não obteve sucesso. Refugiado em Britiande, perto de Lamego, é dali que parte em 1247 em direção a Trancoso, acompanhado por nobres castelhanos que o tinham vindo ajudar, designadamente o infante D. Afonso de Castela, D. Diogo Lopez de Biscaia e D. Nuno Gonçalves de Lara.

O seu objetivo era entrar em Castela a partir de Trancoso, mas sabendo que Trancoso já estava em poder dos pares do Bolonhês, desvia-se em direção a Moreira, ficando a residir ao que se supõe, no castelo da vila ou em casa de um tal Fernão Soveral, o senhor da honra. Grandes senhores, denominados de Sousãos, que residiam em Tranco e que estavam do lado de D. Afonso III, ainda tentaram demover D. Sanho II de ficar em Moreira. Um deles, Fernando Garcia também conhecido por Isgaravunha, chegou mesmo a deslocar-se a Moreira pedindo ao rei que fosse para Trancoso com todos os seus seguidores e que ali seria bem recebido e estimado. Porém, o que não podia levar consigo o seu valido, o homem de confiança, e que se chamava Martim Gil a quem acusavam de responsável pelas desordens que levaram à deposição de D. Sancho. D. Sancho não aceitou e de Moreira partiu para o seu exílio em Toledo, onde veio a falecer a 4 de janeiro de 1248. Fez um segundo testamento em que lega os seus reinos à irmã D. Leonor, pedindo que o sepultem em Alcobaça, junto de seus pais. Esse seu desejo não foi cumprido, jazendo os seus restos mortais em circunstância mal definidas, na catedral de Toledo, onde foi sepultado o seu trisavô Afonso VI de Leão e Castela. Importa referir que o reu que um dia Moreira acolheu, foi casado com D. Mécia Lopes de Haro e não deixou descendência.

O grande escritor e historiador que foi Alexandre Herculano, visitou Moreira em 20 de agosto de 1853 atraído, ao que se escreveu, pelo perfume histórico desta vila, mas já encontrou a sua monumentalidade, designadamente o castelo, em estado de avançada ruína. No princípio do século XVIII, naquela que é a atual freguesia havia duas paróquias: a se Santa Maria, abadia do padroado real, razão pela qual se chama ao pároco de Sr. Abade, e a Santa Marinha vigairaria da Coroa. Nesta altura a povoação tinha 226 fogos, bem em contraste com a cerca de meia centena dos residentes permanentes de hoje. O concelho de Moreira, que foi extinto em 1855, era composto pelas freguesias de Cótimos, Castanheira, Valdujo, Terrenho, Torre do Terrenho, Moreirinhas e Moreira.

Este modesto apontamento, é tão somente uma minúscula parte de uma história feita de histórias por contar, e que corremos o risco de a ver perdida se por este ou outros meios a não a levarmos aos que nós se seguirem. A melhor maneira de homenagearmos a nossa terra, será passando o testemunho da sua história, das suas tradições e lendas, escondidas ainda nos fraguedos enormes que nos serviram de berço e que nos ensinaram a amá-la. Se nós quisermos, Moreira será sempre grande.

Nelson Amaral Veiga

Bibliografia:

  • Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira.
  • Reis e Rainhas de Portugal de Manuel de Sousa

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